Histórias colhidas pelo caminho

Histórias colhidas pelo caminho

Se tua mãe nunca te consolou, provavelmente será difícil que encontre um verdadeiro consolo para o coração nas relações que estabeleças com outras pessoas. Teu trabalho será criar esse sentido de consolo para o coração dentro de si mesmo.

Se tua mãe nunca se compadeceu de você, provavelmente terá pouca paciência com suas próprias falhas, assim como com as dos outros. Teu trabalho será observar a alguém que pratique a compaixão, e praticá-la com você própria.

Se tua mãe silenciava sua própria criatividade, seu trabalho será dar voz a cada impulso criativo que se apresente. Pinta, escreve poesia, toca o tambor, cuida das plantas, cozinha e dança.

Se tua mãe desprezava ou rejeitava seu próprio corpo como mulher, teu trabalho é abraçar e honrar o teu corpo e a tua sexualidade.

Se se sentia abandonada por tua mãe pela razão que fosse, teu trabalho será escutar a teus próprios sentimentos e nunca abandonar a si mesma.

Para que você cure a profunda ferida da sua natureza feminina, é importante que você aceite a sua mãe, compreendendo que talvez ela também tenha recebido pouco e que você mesma se torne uma boa mãe – assumindo a tarefa de ser maternal consigo mesma.”
Maureen Murdock

A mulher que se encontra ferida, doente, insegura, com baixa autoestima, dificuldade de relacionamento, enfim, longe do seu ideal feminino, precisa reencontrar a mãe dentro de si.
Reencontrar a mãe, dar-lhe um lugar, aceitar e acolher, com amorosidade, sua história, para que se reconecte com as mulheres que vieram antes, com sua ancestralidade e, consequentemente, com toda força de vida que existe no seu sistema.
É o caminho, o único.

Patrícia Naves Garcia
Casa da Consciência
Uberlândia – MG
Instagram: @patricianavesgarcia e @casa.da.consciencia
(recebido via whats…)

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Histórias colhidas no caminho

Um grupo de pássaros desejava encontrar a seu rei; então pediram à poupa sábia (um pássaro com crista em forma de abano) que lhes ajudasse em sua busca. A poupa lhes disse que o rei que estão procurando se chama Simurgh (que significa em persa “Trinta Pássaros”) e que vive escondido na montanha de Kaf, porém é uma viajem muito difícil e perigosa.

Os pássaros imploram à poupa que os guie. A poupa aceita e começa a ensinar a cada pássaro de acordo com seu nível e temperamento. Ela lhes diz que para alcançar o alto da montanha, necessitam atravessar cinco vales e dois desertos; quando tiverem passado o segundo deserto, entrarão no palácio do rei.

Os de vontade débil, temerosos da viagem, começam a por desculpas. O louro, que é egocêntrico e egoísta, diz que no lugar de ir em busca do rei, buscará o Santo Gral. O pavão real, a ave legendária do paraíso, exclama que tem sonhado que voltará ao céu e que vai esperar pacientemente esse dia. A pata, se lamenta porque sua vida depende de estar próxima da água e morreria se si separasse dela. A garça tem uma desculpa similar; não lhe é possível viajar longe do mar, porque seu amor pela água é tão grande que, embora permaneça sentado durante anos à sua margem, não tem ousado beber nem uma gota, se não o mar acabaria sem água. A coruja declara que prefere ficar e buscar as ruínas com a esperança de encontrar um tesouro algum dia. O rouxinol diz que não necessita viajar, porque está enamorado da rosa e este amor é suficiente para ele. Possui os segredos do amor que nem outra criatura tem; e com uma voz maravilhosa canta ao amor:

  • Conheço os segredos do amor. Toda noite derramo meu canto de amor. A música mística da flauta se inspira em meu lamento, e sou eu quem faz desabrochar a rosa e comover os corações dos namorados. Ensino mistérios com minhas tristes notas, e quem me ouve se perde em êxtase. Ninguém conhece os meus segredos, unicamente a rosa. Tenho me esquecido de mim mesmo e só penso na rosa. Alcançar a Simurgh está acima de mim! O amor da rosa é suficiente para o rouxinol!


A poupa que escutou pacientemente responde ao rouxinol:

  • Tu estás preocupado com a forma exterior das coisas, pelos prazeres de uma forma sedutora. O amor da rosa tem lançado espinhos a teu coração. Não importa quão grande seja a beleza da rosa, se desvanecerá em poucos dias; e o amor a algo tão passageiro só pode causar repulsa ao perfeito. Se a rosa te sorri é só para enxerte de dor, porque ela rir-se de ti a cada primavera. Abandona a rosa e seu quente calor.

“O que quer dizer Attar com esta simples conversação? Nós humanos temos o desejo de buscar a perfeição, mas muitas vezes tendemos a parar o processo tão logo detectamos o mais ligeiro sinal de progresso. Isto é especialmente certo nos aspirantes ao caminho espiritual: muitos buscadores estão encantados com as primeiras etapas do despertar e o confundem com a completa iluminação. Attar nos adverte de tais perigos: não devemos confundir o amor do imaginário com o amor do Real. Por esta razão, o rouxinol tem que abandonar seu enganoso apego pela rosa para buscar ao eterno Amado.”

A poupa deleita os pássaros com maravilhosas histórias daqueles que têm feito a perigosa viagem. Depois de ter ouvido as histórias da poupa, os pássaros estão inspirados para começar sua viajem até o primeiro vale. Entretanto, logo começam a ter problemas, e se dão conta de que o caminho vai ser mais difícil do que haviam imaginado. Alguns voltam a por desculpas. Um afirma que a poupa não é suficientemente sábia para conduzi-los. Outro se queixa que satanás lhe tem possuído e lhe está pondo as coisas difíceis. E outro expressa seu desejo de ter dinheiro e a comodidade de uma vida de luxo. Finalmente, a poupa decide que a única forma para que os pássaros compreendam, é descrever-lhes os sete vales e desertos da viagem. O primeiro é o Vale da Busca. Aqui se busca a Verdade com inquietude, diz a poupa. Com constância, se busca um significado maior ao propósito da vida. Só um buscador com dedicação pode atravessar a salvo o primeiro vale e ir ao segundo, o Vale do Amor. Aqui se sente um desejo ilimitado de ver ao Rei Amado. Um fogo abrasador começa a crescer no coração e se faz devastador. O lugar é mais perigoso que o primeiro vale, porque há obstáculos no caminho para por a prova o amor. Entretanto esse mesmo amor impulsiona ao buscador sair do vale e ir até uma terra mais alta: o terceiro vale, o Vale do Conhecimento. Uma vez que se entra nesta terra, o coração se ilumina com a verdade. Se adquire aqui o conhecimento interior do Amado. Deste lugar o viajante continua a viajem ao Vale do Desapego, onde perde seus desejos de possessões mundanas. Não existe ataduras com o mundo material para o viajante que atravessa esse vale; liberado dos desejos agora o aspirante é completamente independente.

Cada novo lugar que o buscador encontra é mais perigoso que o anterior e deve ser explorado passo à passo, porque cada um contém suas próprias provas e dificuldades. Assim, cada encontro com uma terra diferente é uma experiência nova.
O quinto vale é o Vale da Unidade. O viajante experimenta nele que todos os seres são unos em essência, que toda variedade de idéias, experiências e criaturas da vida tem realmente uma só fonte.
O viajante chega ao Deserto do Medo. Então se esquece da existência de si mesmo e de todos os demais. Vê a luz, não com os olhos da mente, sim com os olhos do coração. A porta do divino tesouro, o segredo dos segredos, se abre. Nesta terra, o intelecto já não funciona. Aqui se pergunta ao viajante quem é e o que és, responde: “Não sei nada.”
Finalmente chega ao Deserto do Aniquilamento e da Morte. Neste ponto, o aspirante entende finalmente como uma gota se funde no oceano da unidade com o Amado. Tem encontrado o destino da viajem para encontrar ao rei.
Depois de ouvir a descrição da poupa sobre o que lhes espera, os pássaros se animam tanto que imediatamente continuam sua viajem.
No caminho alguns morrem pelo calor e se jogam no mar. Outros se cansam e não podem continuar; um grupo é caçado por animais selvagens e outros mais se distraem tanto pelo atrativo das terras que atravessam, que se perdem e ficam para trás. Só trinta alcançam seu destino: a montanha de Kaf.
No palácio real, o guarda da entrada trata cruelmente os trinta pássaros. Mas os pássaros, que têm passado o pior, são tolerantes e não se permitem sentir-se molestados por sua dureza. Finalmente, o servidor pessoal do rei sai e conduz os pássaros ao salão real. Ao entrar, os pássaros olham tudo assustados. Não sabem o que ocorre, porque no lugar de ver a Simurgh, “Trinta Pássaros”, tudo o que vêm é… Trinta Pássaros.
Finalmente compreendem que, olhando-se a si mesmos, têm encontrado ao rei, e que em sua busca do rei, têm encontrado a si mesmos.
Os que atravessam as sete cidades do amor se purificam. Quando chegam ao palácio real, encontram ao rei que se revela a seus corações.

“Fariduddin Attar”
(extraído do livro: História de la Tierra de los Sufíes)

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Há muitos anos, um aluno perguntou à antropóloga Margaret Mead o que ela considerava ser o primeiro sinal de civilização numa cultura. O aluno esperava que Mead falasse a respeito de anzóis, panelas de barro ou pedras de amolar. Mas não.

Mead disse que o primeiro sinal de civilização numa cultura antiga era um fêmur (osso da coxa) quebrado e cicatrizado. Mead explicou que no reino animal, se você quebrar a perna, morre. Você não pode correr do perigo, ir até o rio para beber água ou caçar comida. Você é carne fresca para os predadores. Nenhum animal sobrevive a uma perna quebrada por tempo suficiente para o osso sarar.

Um fêmur quebrado que cicatrizou é evidência de que alguém teve tempo para ficar com aquele que caiu, tratou da ferida, levou a pessoa à segurança e cuidou dela até que se recuperasse. “Ajudar alguém durante a dificuldade é onde a civilização começa” disse Mead.

Estamos no nosso melhor quando servimos aos outros.

(enviada pelo amado amigo Gui Fassi)

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Nós criamos uma barreira entre homens e mulheres, homens e crianças, homens e meninas. É cultural e aposta na “incompetência” emocional masculina – outra construção cultural.

Homens precisam ser ensinados a lidar com emoções, família, crianças, tarefas domésticas, como nós, mulheres, somos.

E vale lembrar que nós, mulheres, somos parte dessa cultura, então temos que desconstruir nas nossas relações essa diferença.

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Estou na Finlândia, Helsinki. Férias, a caminho da Rússia. É verão. Eu, vindo do Brasil, o país dos verões, vou à uma das principais piscinas coletivas da cidade, bem no centro, em frente ao porto. Pago a taxa, ganho uma toalha e uma pulseira. Procuro o vestiário masculino. Encontro. Está vazio. Abro a porta e logo na entrada, sem nenhuma divisória ou corredor, estão os bancos e armários onde as pessoas trocam de roupa e guardam suas coisas. Exatamente ao lado, o enorme box de vidro, transparente e os chuveiros coletivos para o banho. Reparo na enorme falta de privacidade em relação aos padrões brasileiros. Cada vez que alguém abre a porta de entrada, todo mundo que está do lado de fora vê exatamente tudo lá dentro. Acho curioso, divertido até. Deixo minha toalha de cima do banco, tiro a roupa inteira e entro no chuveiro. Há apenas um homem ao lado, um finlandês, relaxando debaixo d’água. Quando já estou no meio do banho, a porta se abre e tomo um susto de gelar a espinha. Um outro homem finlandês entra, mas acompanhado das duas filhas pequenas, de 7 ou 8 anos, com suas pequenas boias de nadar. Me viro de costas imediatamente, contra a parede, completamente constrangido, quase em pânico, sem entender e com medo de estar no lugar errado. Quando, no Brasil, eu estaria nu ao lado de duas meninas pequenas em um banheiro público? O homem do meu lado termina o banho e sai, enrolado na sua toalha. A minha não está comigo, ela ficou lá em cima dos bancos, e as duas meninas estão sentadas provavelmente ao lado dela. Apenas fecho os olhos e espero. Será que existe um outro cômodo para trocar de roupa e eu não vi? Será que este vestiário proíbe banhos sem roupa e eu não li o aviso? Vou tomar uma multa? Vou ser preso? Completamente travado, fico ali por muito tempo. Muitas pessoas entram e saem, mas continuo do mesmo jeito, contra a parede, até não ouvir voz nenhuma. Um alívio, o vestiário está vazio. Saio correndo do chuveiro, visto a roupa apressado, abro a porta e saio. Dez minutos depois, percebo que esqueci metade das minhas coisas de cima do banco. Volto ao vestiário. O pai e as duas filhas estão lá, tranquilamente embaixo do chuveiro, tomando banho ao lado de vários homens nus. Ninguém liga pra ninguém. Ninguém precisa olhar pra ninguém. Apenas, naturalmente como há de ser, as pessoas cuidam cada uma da sua vida fazendo algo que todo ser humano precisa: tomar um banho. Saio rindo de mim mesmo e, pelo resto do dia, passo a refletir sobre como nascer em um país como o Brasil, violento, misógino, com índices enormes de estupro e feminicídio, adoece toda a nossa prática social. Pensando em como o feminismo está definitivamente certo ao dizer que os nossos costumes e comportamentos em relação à diferença de gênero são sim muito mais construções políticas, construções de socialização do que “natureza biológica”. Os dados dizem que Finlândia é considerada um dos melhores lugares do mundo para ser mulher. A taxa de estupros e de abuso sexual é baixíssima e, obviamente, a cultura do estupro também é ínfima. Além da igualdade salarial entre homens e mulheres, da representação feminina na política, o país escandinavo tem um título mundial muito valoroso: a Finlândia é considerada o melhor país do mundo para ser mãe. A licença maternidade no país é de três anos para a mãe e um ano para o pai. Desde que cheguei, me deparo o tempo todo, em absolutamente todos os lugares, com homens sozinhos cuidando de suas crianças pequenas, provavelmente enquanto as mães trabalham. Homens sozinhos limpando cocô das fraldas nos bancos do shopping, nas praças, no aeroporto. Homens sozinhos empurrando carrinhos de bebê em todos os cruzamentos das avenidas, homens sozinhos lendo livros para as crianças no parque, dando mamadeira, ninando seus bebês, sendo o que deveriam ser: pais. Por isso, obviamente aquele pai que entrou no chuveiro com suas filhas ao lado de vários homens desconhecidos nus não imagina que outro homem finlandês ali, como ele, terá qualquer sentimento de violência ou de perversão em relação àquelas crianças. Provavelmente aqueles homens todos ao meu lado, tomando banho, encontram-se por aí e sorriem um para os outros ao empurrarem seus carrinhos e ao comprarem fraldas juntos no supermercado. Se mulheres podem tranquilamente entrar com seus meninos pequenos em um vestiário feminino (e isso acontece no mundo todo), por que homens não podem entrar em um vestiário masculino com suas meninas?Claro que o choque cultural é enorme e tal situação é completamente impraticável e impossível em um país como o Brasil. No entanto, um exemplo como esse, a vivência em uma sociedade igualitária em um país da Escandinávia, região apontada como rascunho do que seria o socialismo se vingasse, ensina muito a nós como brasileiros e mais ainda a nós como brasileiros homens. Na Finlândia uma mulher pode ir a uma festa de minissaia, ficar muito bêbada, voltar a pé para casa às três da madrugada, deitar em um ponto de ônibus e ficar ali até ao dia amanhecer. Nada vai acontecer a ela. Por que? Por que na Finlândia existem menos “doentes estupradores’ do que no Brasil? Não. Porque a “doença” do estupro não é individual, ela é social, coletiva e tem cura quando toda a sociedade melhora. O contato com o vestiário público de Helsinki é um convite a nós, homens brasileiros que apoiam o feminismo, a criar cada vez mais condições para que as mulheres brasileiras façam essa luta. Chega de assobiar na rua, chega de ficar encarando uma mulher que resolveu sair de casa sem sutiã ou com uma roupa mais curta, chega de achar que uma praia com mulheres de top less ou um bloco de carnaval onde elas tiram a blusa (como nós) é um convite ou permissão a qualquer coisa. Nós homens precisamos colaborar com a criação de espaços de naturalidade e confiança para que mulheres se juntem e se sintam bem por estarem livres no mundo, como nós nos sentimos. Chega de criarmos os nossos filhos homens educando-os a tratar mulheres como um “item de consumo”, chega de criarmos nossas filhas mulheres tratando-as como um “patrimônio” ou um “tesouro”. São os passos possíveis para a nossa geração em um futuro de menos desigualdade. O machismo faz muito mal para todos nós. Façamos o possível para o Brasil e o mundo, um dia, serem como uma piscina coletiva de Helsinki, onde a única tensão envolvida entre um homem e uma mulher é a disputa do melhor lugar para curtir o sol do verão.

(Artênius Daniel, via facebook)

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